Aos sete anos, Yang da Silêncio já começava a dar os primeiros passos na arte de esculpir em madeira. Ele conta que aprendeu ao observar o pai, o Rabi Petrônio, que aprendeu com Rabi Fernando, um dos primeiros artesãos da Ilhéu do Ferro, na cidade de Pão de Açúcar, em Alagoas. “Acompanhava meu pai fazendo as peças e, quando ele largava as ferramentas para se ocupar de outra coisa, eu pegava os instrumentos e começava a ‘reinar’ com pedaços de madeira”, relembra da Silêncio.
As primeiras peças dele, ainda pequeno, foram formigas, passarinhos e outras do seu imaginário, sempre inspiradas nas obras que o pai produzia naquela idade. Hoje, uma vez que presidente da Associação Ilhéu das Artes e primeiro do Projeto Reflorilha, o alagoano dá perpetuidade à sua arte enquanto luta para reflorestar a Ilhéu do Ferro e prometer, por meio da sustentabilidade, o porvir econômico da comunidade artesã e das gerações que ainda estão por vir.
Antes de viver o projeto, há muitos anos, meu pai já plantava mudas para reflorestar a região, principalmente no terreno dele, mas também para doar. Inspirado nele, comecei a fazer o mesmo.
Yang da Silêncio, artesão.
O alagoano conta que no início plantavam Mulungu, que é usado no trabalho dos artesãos e cresce rápido; mas em conversas com o pai e outras pessoas da região sobre desmatamento, chegaram à desfecho de que precisam de mais mudas. “Tinha muita gente desmatando e cortavam muitas das árvores com as quais a gente trabalha”, relata. “Foi logo que pensamos: ‘uma vez que é que a gente vai trabalhar no porvir se o pessoal estiver só destruindo e não plantar mais zero?’”, relembra.
Yang da Silêncio criou o projeto Reflorilha, para reflorestar a Ilhéu de Ferro. Foto: Registro pessoal.
O projeto
O Projeto Reflorilha foi idealizado com o suporte do Programa Alagoas Feita à Mão, do Sebrae, que há anos já desenvolve ações com as artesãs e os artesãos da região, conhecidos pela produção do bordado Boa Noite e pelas peças entalhadas em madeira. Agora, a proposta é integrar arte e sustentabilidade nas margens do Rio São Francisco, com a participação ativa dos moradores.
Com o plantio de mudas, a iniciativa pretende educar e sensibilizar a comunidade para que se torne uma prática recorrente e que desperte cada vez mais nos moradores a preocupação e o zelo que devem ter com o envolvente em que vivem e a atividade que exercem uma vez que meio de vida. Logo no início de 2023, os artesãos locais formalizaram a Associação de Artesanato em Madeira da Ilhéu do Ferro – Ilhéu das Artes, presidida por Yang da Silêncio e com 37 membros atualmente. São eles que, junto do Sebrae, colocam em prática as iniciativas do Reflorilha.
“Desde o início do projeto, já fizemos quatro eventos, três de plantio das mudas e um de produção de mudas”, comenta da Silêncio. No primeiro, realizado em dezembro de 2023, foram plantadas milénio mudas de espécies nativas da caatinga doadas pela Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf). Além do reflorestamento, também foram iniciadas capacitações, projeto de reciclagem, ações com foco no turismo consciente e na sustentabilidade das atividades econômicas.
Apesar dos principais objetivos serem o reflorestamento e a garantia da sobrevivência futura do artesanato, o Reflorilha não se limita a eles, buscando também prometer políticas públicas que melhorem a qualidade de vida e promovam a diversificação da economia criativa na região. A proposta do Sebrae é que o projeto consiga ainda manter um banco de sementes com as principais espécies sertanejas, incluindo as mais raras, que sofrem risco de extinção no bioma.
Artesanato produzido por Yang da Silêncio é inspirado nas obras do próprio pai. Foto: Registro pessoal.
Porvir sustentável 
“Em cinco anos, já deveremos estrear a ver os frutos do Reflorilha”, prevê da Silêncio. “Simples que não conseguiremos trabalhar com algumas mudas que estamos plantando hoje, uma vez que é o caso da umburana, que precisa de pelo menos uns 100 anos viva e uns 20 anos morta”, explica o artesão. Embora algumas das mudas plantadas exijam longos períodos de incremento, outras, uma vez que o mulungu e o pereiro, oferecem a possibilidade de uso em um prazo mais limitado. O projeto visa colher os frutos dessa dedicação em até 15 anos, permitindo que a comunidade produza sua própria matéria-prima de forma sustentável.
Inspiração
Yang da Silêncio acredita que o sucesso do Reflorilha poderá inspirar outros artistas a adotarem práticas semelhantes, reforçando a influência do zelo coletivo com o meio envolvente. “Se nosso projeto der muito notório, e vai dar, conseguiremos fazer uma boa divulgação e poderemos motivar pessoas de outros lugares a fazerem o mesmo. Porque o zelo com o meio envolvente tem que ser de todos. Não adianta fazermos a nossa segmento e outras pessoas não fazerem.”
Da Silêncio integra ainda a Artesol, ONG que atua promovendo a valorização do artesanato cultural brasílio. “É um grupo que cataloga os artistas do Brasil. Em algumas reuniões, citaram o nosso trabalho na Ilhéu para tentar motivar outros artistas a produzirem mudas das árvores nativas de sua região para reflorestar.” O alagoano destaca que um trabalho sustentável não exclusivamente beneficia a natureza, mas também valoriza as peças produzidas. “Quanto mais sustentável for o trabalho, mais valor terão”, salienta.